Em abril, Milão pulsa criatividade. Mais do que uma cidade que sedia o Salone del Mobile, ela se transforma em uma verdadeira cartografia de experiências durante o FuoriSalone, quando ruas, palácios e claustros se tornam palco para narrativas sensoriais, exposições autorais e encontros improváveis entre tradição e vanguarda.
No claustro de San Simpliciano, a Gucci apresentou “Bamboo Encounters”, uma homenagem poética ao bambu — símbolo de resistência e leveza da maison desde os anos 1940. Artistas e designers internacionais foram convidados a explorar as possibilidades simbólicas e formais do material, em uma instalação que mais parecia um jardim contemplativo, onde o tempo se dilatava entre sombras e texturas.

Já a Hermès ocupou a La Pelota com uma verdadeira aula de expografia: cubos brancos flutuantes e geometrias filtradas por luz revelavam, com precisão quase ritualística, suas novas criações. As peças se revelavam passo a passo, como se esperassem o olhar certo para emergir. Vidros coloridos, mesas com camadas translúcidas e atmosferas rarefeitas compunham um jogo sutil entre matéria e percepção — um convite ao silêncio e à presença.

No Palazzo Citterio, a Louis Vuitton dividiu sua mostra em dois tempos e espaços. No pátio, o “Nomadic Pavilion” evocava uma morada nômade — leve, fluida e respeitosa à arquitetura clássica do entorno. Internamente, os “objetos nômades” ganhavam vida própria: couro, madeiras e acabamentos manuais compunham mobiliários de refinamento sereno, criados por nomes como Patricia Urquiola e o Estúdio Campana. A expografia silenciosa fazia do palácio uma moldura, e das peças, uma extensão de sua própria história.

No Palácio Bovara, a Elle Decor celebrou seus 35 anos com a exposição “Alquímica”, também assinada por Urquiola. O projeto propunha uma casa em constante transformação, onde cada cômodo era uma metáfora visual da transmutação da matéria e do afeto. A grandeza arquitetônica do edifício não foi pano de fundo, mas parte viva da experiência: colunas, texturas, janelas e luzes compunham a narrativa com os móveis em cena. O resultado foi um diálogo preciso entre arquitetura histórica e design contemporâneo.

Já no Cortile della Seta, a Loro Piana, em parceria com o Dimore Studio, ofereceu uma imersão cinematográfica: uma sala de espera de cinema, cortinas de veludo, anúncios misteriosos e uma sequência de salas escuras onde o mobiliário surgia em cenas densas, quase teatrais. A instalação era tão sensorial que filmagens eram proibidas. Restava apenas viver — e lembrar.

Entre instalações, vitrines, encontros e surpresas, Milão provou, mais uma vez, que durante a semana de design, não há distinção entre cidade e galeria. Tudo é manifesto. Tudo é obra.
Porque em Milão, o design não é apenas visto — ele é vivido.